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Revisão do FGTS: mudanças recentes no STF

Antes de aprofundarmos o tema do presente artigo, é importante relembrar aos leitores qual a função social do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço):

O objetivo do FGTS é a preservação do patrimônio financeiro dos trabalhadores, por meio de uma “poupança forçada”, podemos assim dizer.

Desse modo, para proteger o “dinheiro” dos empregados em regime celetista, as empresas realizam o pagamento do valor correspondente a 8% do salário-base dos trabalhadores para este Fundo, que, obviamente, deve ser reajustado (corrigido) ao longo do tempo, justamente para se alcançar a finalidade social do FGTS: A proteção do patrimônio financeiro do trabalhador ao longo dos anos, após uma dispensa sem justa causa ou rescisão por acordo.

A importância do caráter protetivo atribuído ao Fundo fica ainda mais evidente quando o empregado é dispensado sem justa causa. Nessa modalidade de dispensa, a empresa ainda realiza o pagamento de uma multa, no valor de 40% sobre o saldo total existente no Fundo, visando garantir uma estabilidade financeira após a demissão unilateral do trabalhador.

Além disso, por se tratar de verdadeiro patrimônio (propriedade) do trabalhador, é possível o saque-aniversário (e não somente no dia da demissão), assim como a antecipação das parcelas do FGTS, muito comum ultimamente.

Chegamos, então, ao tema central do estudo, que busca esclarecer mais sobre a possibilidade de Revisão do saldo existente no FGTS.

O índice da correção monetária dos valores do FGTS vem previsto no art. 13, caput, da Lei Federal nº 8.036/1990 e no art. 17, caput da Lei Federal nº 8.177/1991, indicando que a correção será realizada pela TR (Taxa referencial).

A TR foi criada nos anos 1990 e tinha o objetivo de ser referência para os juros praticados na economia brasileira, protegendo o poder de compra e ajudando a controlar a alta inflação da época.
No entanto, a referida Taxa Referencial apresentou defasagem a partir do ano de 1999, devido a alterações realizadas pelo Banco Central do Brasil.

Com isso, foi promovida, perante o Supremo Tribunal Federal, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5090), buscando a declaração de inconstitucionalidade do caput do art. 13, da Lei Federal nº 8.036/1990 e do caput do art. 17 da Lei Federal nº 8.177/1991 – dispositivos impõem a correção dos depósitos nas contas vinculadas do FGTS pela Taxa Referencial (TR).
Desse modo, chegou-se à constatação de que a TR, desde 1999 não repõe as perdas inflacionárias, como por exemplo o INPC e o IPCA, que são índices que acompanham a inflação.

Sendo assim, o saldo na conta do FGTS esteve “perdendo” para a inflação durante todos esses anos. A título ilustrativo: se os preços aumentam em 5% durante um ano, o índice de correção monetária, visando proteger o poder de compra, deve acompanhar (ou ser ainda maior) que a inflação do período que, no nosso exemplo, foi de 5%.

Inicialmente, portanto, os valores depositados nas contas vinculadas deveriam ser “corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização de juros de 3% ao ano”. O que não era ruim à época.

Mas, com o passar dos anos, essa forma de compensação (TR) foi ficando defasada diante da evolução da inflação e outras formas de correção monetária praticadas no mercado financeiro.
Portanto, concluímos que o saldo do FGTS é patrimônio financeiro do trabalhador, constitucionalmente garantido, visando a proteção econômica contra a inflação, de modo que a taxa referencial não protege esse dinheiro desde 1999.

Um ponto curioso, que veio à tona com o julgamento da ADI pelo STF, em diversas manifestações, como apontado pelo Ministro Relator, Luis Roberto Barroso, a própria Procuradoria Geral da República informou que o FGTS é regulado para favorecer a aplicação de recursos e gerar rendimentos para a execução da política habitacional com baixas taxas de financiamento. Ou seja, a interpretação que se tem é que o FGTS não “rende” aos trabalhadores o que deveria render, pois suporta, de outro lado, o financiamento habitacional com taxas mais baixas, por exemplo.

No julgamento da ADI 5090, o Ministro Luis Roberto Barroso afirmou:
Em síntese, os trabalhadores – entre eles os estratos mais vulnerabilizados e hipossuficientes da população – têm parte de seu fundo de garantia sacrificado para custear investimentos que interessam à sociedade como um todo, inclusive aos mais abastados. Em outras palavras, para evitar lançar mão de recursos públicos para a consecução de fins igualmente públicos, a União optou por impor aos trabalhadores, unilateralmente, o peso da satisfação dos interesses gerais. O que se tem, portanto, é uma aplicação financeira compulsória, muito semelhante à poupança, em que os cotistas são forçados a suportar uma remuneração extremamente baixa – muito inferior a qualquer outra aplicação, inclusive as mais conservadoras. A funcionalização da propriedade privada, em tais condições, ultrapassa o limite do razoável, porque se impõe a um grupo de hipossuficientes o custo integral de uma política de interesse coletivo, sem remuneração condizente com essa situação.

Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal julgou parcialmente procedente a ADI para determinar que a correção monetária do saldo do FGTS deve corresponder, ao menos, o índice da Caderneta de poupança.
Entretanto, em 12/06/2024, o STF alterou a forma da correção monetária, acatando a fórmula proposta pelo governo, por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), de definir o reajuste pela soma da TR (Taxa Referencial) mais 3% e a distribuição dos lucros do fundo, ou seja, da mesma maneira que era, mas garantindo que os valores acompanhem o IPCA. Se ocorrer de o valor ficar abaixo da inflação, o Conselho Federal do FGTS irá regular a questão para que os valores alcancem o IPCA.

Assim, após a decisão da maioria do STF, foi mantida a correção pela taxa referencial + 3% ao ano, mas com a garantia de que essa correção atinja a inflação oficial medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Além disso, foram modulados os efeitos para que essa garantia passe a valer a partir da decisão referida, que ocorreu em 12/06/2024. Ou seja, após a referida data, o saldo existente no FGTS continuará a ser corrigido pela soma da TR (Taxa Referencial) mais 3% e a distribuição dos lucros do fundo, mas com a garantia de que a correção não seja inferior ao IPCA.

O IPCA apresenta o percentual de 4,23% nos últimos 12 meses. Nesse sentido, todos os juízes devem respeitar a decisão do STF, de modo que os processos judiciais em andamento serão julgados com a observância à decisão e sem o pagamento de quaisquer atrasados.

Infelizmente, assim como a revisão da vida toda, não há vitória para os trabalhadores, pois justamente o objetivo dessas ações era buscar as perdas do passado e isso não foi deferido pelo STF, de modo que a correção observando o IPCA será aplicado da data da decisão em diante.

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