A profissão de comissário de bordo, essencial para a segurança e o conforto dos passageiros em voos comerciais, envolve condições de trabalho peculiares que podem impactar a saúde a longo prazo. A exposição a agentes nocivos como ruído, radiação ionizante, variações de pressão atmosférica e riscos inerentes à atividade aérea confere a esses profissionais o direito à Aposentadoria Especial, um benefício previdenciário com regras diferenciadas.
Contudo, a Reforma da Previdência de 2019 (Emenda Constitucional nº 103/2019) trouxe mudanças significativas para essa modalidade de aposentadoria. Muitos comissários de bordo se perguntam como ficou o cálculo do benefício e se a aposentadoria especial ainda representa uma vantagem.
Neste guia completo, vamos desvendar o passo a passo do cálculo da aposentadoria especial do comissário de bordo, comparando as regras anteriores e posteriores à reforma, e analisar se essa ainda é a melhor opção para você. Continue lendo para entender seus direitos e planejar seu futuro!
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ToggleO que mudou com a reforma da previdência (EC 103/2019)?
Antes da Reforma da Previdência, em vigor até 12 de novembro de 2019, a aposentadoria especial para comissários de bordo exigia apenas a comprovação de 25 anos de atividade especial, sem a necessidade de cumprir uma idade mínima. Além disso, o cálculo do benefício era mais vantajoso.
Com a EC 103/2019, as regras mudaram:
- Direito Adquirido: Quem completou os 25 anos de atividade especial até 12/11/2019 ainda pode se aposentar pelas regras antigas, mais benéficas.
- Regra de Transição (Pontos): Para quem já contribuía antes da reforma, mas não completou os 25 anos, foi criada uma regra de transição. É preciso somar a idade e o tempo de contribuição (incluindo o tempo especial) para atingir uma pontuação mínima, além dos 25 anos de atividade especial. Em 2025, essa pontuação é de 86 pontos.
- Nova Regra Permanente: Para quem começou a contribuir após 13/11/2019, a aposentadoria especial exige 25 anos de atividade especial e uma idade mínima de 60 anos.
Cálculo da aposentadoria especial: Antes da reforma (Direito adquirido)
Para os comissários de bordo que completaram os 25 anos de atividade especial até 12/11/2019, o cálculo da aposentadoria especial segue a regra antiga, que geralmente resulta em um valor de benefício maior.
- Passo 1: Calcular o Salário de Benefício (SB): Faz-se a média aritmética simples dos 80% maiores salários de contribuição desde julho de 1994 até o mês anterior à aposentadoria. Os 20% menores salários são descartados, o que eleva o valor da média.
- Passo 2: Calcular a Renda Mensal Inicial (RMI): O valor da aposentadoria especial correspondia a 100% do Salário de Benefício. Não havia aplicação de redutores ou do fator previdenciário.
Exemplo (Pré-Reforma): Um comissário com 25 anos de atividade especial completados em 2018, cuja média dos 80% maiores salários desde 07/1994 foi de R$ 5.000,00, teria uma RMI de R$ 5.000,00.
Cálculo da Aposentadoria Especial: Depois da Reforma (Regra de Transição e Nova Regra)
Para quem se enquadra na Regra de Transição (86 pontos) ou na Nova Regra Permanente (60 anos de idade), o cálculo do benefício mudou e tornou-se menos vantajoso.
- Passo 1: Calcular a Média Salarial: Faz-se a média aritmética simples de TODOS os salários de contribuição desde julho de 1994 até o mês anterior à aposentadoria. Não há mais o descarte dos 20% menores salários, o que pode diminuir o valor da média em comparação com a regra antiga.
- Passo 2: Calcular a Renda Mensal Inicial (RMI): O valor da aposentadoria corresponde a 60% da média salarial calculada no Passo 1, com um acréscimo de 2% para cada ano de contribuição que exceder 20 anos para homens e 15 anos para mulheres.
Exemplo (Pós-Reforma – Homem): Um comissário com 25 anos de atividade especial e 61 anos de idade (somando 86 pontos, regra de transição) em 2025. Sua média de todos os salários desde 07/1994 foi de R$ 5.500,00. O cálculo da RMI será: 60% + (2% x 5 anos*) = 70%. RMI = 70% de R$ 5.500,00 = R$ 3.850,00. (*5 anos que excederam os 20 anos mínimos de contribuição para homens).
Exemplo (Pós-Reforma – Mulher): Uma comissária com 25 anos de atividade especial e 61 anos de idade (somando 86 pontos, regra de transição) em 2025. Sua média de todos os salários desde 07/1994 foi de R$ 5.500,00. O cálculo da RMI será: 60% + (2% x 10 anos**) = 80%. RMI = 80% de R$ 5.500,00 = R$ 4.400,00. (**10 anos que excederam os 15 anos mínimos de contribuição para mulheres).
Como comprovar a atividade especial de comissário de bordo
Para obter a aposentadoria especial, o comissário de bordo precisa comprovar a exposição aos agentes nocivos durante o período trabalhado. Os principais documentos necessários são:
- Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP): Documento fornecido pela empresa aérea que detalha as condições de trabalho, incluindo os agentes nocivos a que o profissional esteve exposto.
- Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT): Documento que fundamenta as informações do PPP, elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança.
- Carteira de Trabalho e Contratos: Que comprovem o vínculo empregatício como comissário de bordo.
É importante que o PPP indique claramente a exposição à pressão atmosférica anormal, ruídos excessivos, radiação ionizante ou outros agentes nocivos específicos da profissão de aeronauta.
A tese dos 20 Anos para aeronautas
Existe uma discussão jurídica relevante conhecida como “Tese dos 20 Anos”, que se baseia no Decreto 83.080/79. Este decreto, em seu anexo (código 1.1.6), estabelecia que aeronautas expostos à pressão atmosférica anormal poderiam ter direito à aposentadoria especial com apenas 20 anos de contribuição, e não 25.
Até 05/03/1997, a regulamentação previa essa possibilidade. Após essa data, com a entrada em vigor do Decreto 2.172/97, a exigência foi elevada para 25 anos. Diversos processos têm obtido decisões favoráveis nos tribunais reconhecendo o direito aos 20 anos para períodos trabalhados antes de 05/03/1997.
Esta tese pode ser especialmente vantajosa para comissários de bordo com tempo de serviço mais antigo, podendo reduzir significativamente o tempo necessário para a aposentadoria.
Aposentadoria especial do comissário de bordo: Ainda vale a pena?
A resposta a essa pergunta depende da situação individual de cada comissário de bordo.
Vantagens:
- Tempo Reduzido: A principal vantagem que permanece é a possibilidade de se aposentar com menos tempo de contribuição (25 anos) em comparação com as regras comuns de aposentadoria por tempo de contribuição ou idade.
- Direito Adquirido: Para quem cumpriu os requisitos antes da reforma, as regras antigas são extremamente vantajosas, garantindo um benefício integral sem idade mínima.
- Regra de Transição: Pode ser vantajosa para quem começou a trabalhar cedo e acumulou muitos pontos, permitindo a aposentadoria antes da idade mínima da regra comum, mesmo com o cálculo menos favorável.
- Tese dos 20 Anos: Existe a possibilidade de reconhecimento judicial do direito à aposentadoria especial para aeronautas com apenas 20 anos de atividade, baseada em decretos antigos. Se essa tese for aplicada ao seu caso, pode representar uma vantagem significativa.
Desvantagens:
- Cálculo Pós-Reforma: A forma de cálculo após a reforma (média de 100% dos salários e coeficiente inicial de 60%) geralmente resulta em um valor de benefício menor do que na regra antiga.
- Idade Mínima/Pontos: A introdução da idade mínima (nova regra) ou da pontuação (regra de transição) tornou o acesso mais difícil em comparação com a regra antiga, que não exigia idade.
- Impedimento de Continuar na Atividade: O aposentado especial não pode continuar exercendo a atividade que lhe deu direito ao benefício. Se o comissário de bordo se aposentar pela regra especial, não poderá mais voar na função.
Análise Final:
A aposentadoria especial ainda pode valer a pena, principalmente para quem tem direito adquirido ou se encaixa bem na regra de transição por pontos, conseguindo se aposentar mais cedo. No entanto, é fundamental realizar um planejamento previdenciário detalhado.
Um advogado especialista poderá analisar seu histórico de contribuições, verificar a documentação comprobatória da atividade especial (como o PPP), calcular o valor do benefício em todos os cenários possíveis (incluindo a conversão de tempo especial em comum para períodos trabalhados antes da reforma) e orientar sobre a melhor estratégia para o seu caso.
Como solicitar a aposentadoria especial de comissário de bordo
Para solicitar a aposentadoria especial, o comissário de bordo deve seguir estes passos:
- Reunir a documentação necessária: PPP, LTCAT, carteira de trabalho, documentos pessoais e comprovantes de contribuição.
- Agendar atendimento no INSS: Pode ser feito pelo site ou aplicativo Meu INSS, ou pela Central de Atendimento 135.
- Fazer o requerimento: Pode ser realizado online pelo portal Meu INSS ou presencialmente na agência agendada.
- Acompanhar o processo: Pelo portal Meu INSS ou aplicativo.
É altamente recomendável contar com o auxílio de um advogado especializado em direito previdenciário, pois o reconhecimento da atividade especial frequentemente enfrenta resistência por parte do INSS, especialmente após a Reforma da Previdência.
Concluímos que…
O cálculo da aposentadoria especial do comissário de bordo sofreu alterações importantes com a Reforma da Previdência. Embora as regras pós-reforma sejam menos vantajosas em termos de valor do benefício e requisitos de acesso, a possibilidade de se aposentar com 25 anos de atividade especial ainda pode ser um diferencial importante.
A decisão sobre qual caminho seguir exige análise cuidadosa e planejamento. Buscar assessoria jurídica especializada é o passo mais seguro para garantir que você tome a melhor decisão e obtenha o benefício mais vantajoso possível, considerando sua trajetória profissional e seus objetivos para o futuro.
Nosso escritório possui ampla experiência em aposentadoria especial para aeronautas e comissários de bordo. Entre em contato para uma análise personalizada do seu caso.
Perguntas frequentes
1. Comissário aposentado pode continuar trabalhando em outra função?
Sim. O aposentado por aposentadoria especial está impedido apenas de continuar exercendo a atividade que lhe deu direito ao benefício. Pode trabalhar em qualquer outra função que não envolva exposição aos mesmos agentes nocivos.
2. É possível converter tempo especial em comum?
Sim, para períodos trabalhados até 13/11/2019 (data da Reforma). O tempo especial é multiplicado por 1,4 para homens e 1,2 para mulheres quando convertido em tempo comum.
3. Como funciona a contagem de pontos na regra de transição?
Soma-se a idade do segurado com o tempo de contribuição. Por exemplo, um comissário com 56 anos de idade e 30 anos de contribuição terá 86 pontos.
4. O que acontece se eu tiver períodos como comissário e períodos em outras funções?
Os períodos como comissário podem ser considerados especiais (mediante comprovação) e os demais como tempo comum. É possível somar ambos, inclusive com a conversão do tempo especial em comum para períodos até 13/11/2019.
5. A aposentadoria especial tem direito à paridade e integralidade?
Não. Esses conceitos se aplicam apenas a servidores públicos. No RGPS (INSS), o valor do benefício é calculado conforme as regras explicadas neste artigo.