Tema 709, a Aposentadoria Especial dos Aeroviários e a necessidade de se afastar do trabalho

Tema 709, a Aposentadoria Especial dos Aeroviários e a necessidade de se afastar do trabalho

Tratarei do tema 709 do STF, julgado no dia 05/06/2020, que analisou o direito de continuar na função tida por especial. 

Se você já completou 25 anos de aviação e não sabe qual decisão tomar, leia até o final deste artigo, em especial o tópico de nº. 6.

Quem tem direito a Aposentadoria Especial?

Em primeiro lugar, devo esclarecer o que é Aposentadoria Especial e diferenciar a Aposentadoria Especial antes e depois da Reforma da Previdência.

O que é a Aposentadoria Especial?

Aposentadoria Especial é aquela Aposentadoria em que é exigido um tempo de trabalho menor para fins de aposentação em razão do trabalho exposto a agentes nocivos a saúde.

Na grande maioria dos casos o tempo de trabalho exigido é de 25 anos, contudo há alguns poucos casos em que serão exigidos 20 ou até mesmo 15 anos de tempo de trabalho para conquistar a aposentadoria especial.

A redução do tempo de trabalho se justifica em razão da nocividade do trabalho, que no curto ou no longo prazo trará prejuízos para a saúde do trabalhador, justificando assim o tempo reduzido para a aposentadoria.

Aposentadoria Especial antes e depois da Reforma.

A Aposentadoria Especial antes da Reforma da Previdência exigia tão somente 25, 20 ou 15 anos de atividade especial para adquirir o direito a aposentadoria especial. Não havia idade mínima necessária e nem pontuação mínima a ser atingida.

A Aposentadoria Especial após a Reforma da Previdência passou a tratar duas formas de aposentadoria, primeiro para quem já contribuía antes da reforma e em segundo para quem nunca contribuiu para a previdência, vindo a contribuir somente após a reforma.

Para quem já contribuía antes da Reforma da Previdência foi criada a Regra de Transição da Aposentadoria Especial.

Nesta Regra de Transição é exigido o tempo mínimo de 25 anos de atividade especial assim como o atingimento de 86 pontos, que será a soma do tempo especial + o tempo comum + a idade.

Para quem nunca havia contribuído antes da Reforma da Previdência foi criada a Regra Definitiva da Aposentadoria Especial, que passou a exigir a idade mínima de 60 anos para quem se aposentar com 25 anos de atividade especial.

Portanto, a diferença básica de cálculo para obtenção da Aposentadoria Especial pode ser traduzida na seguinte situação:

ANTES DA REFORMA:

Basta 25 anos de tempo especial.

DEPOIS DA REFORMA – REGRA DE TRANSIÇÃO:

Precisa ter 25 anos de tempo especial e somar 86 pontos (tempo total + idade).

DEPOIS DA REFORMA – REGRA DEFINITIVA:

Precisa ter 25 anos de tempo especial e no mínimo 60 anos de idade.

O que é o TEMA 709 do STF?

O Tema 709 do STF é um processo que iniciou como um pedido de aposentadoria especial de uma auxiliar de enfermagem de Porto Alegre/RS, no qual o Tribunal Regional Federal da 4º Região (TRF4) decidiu que não era devido o afastamento da atividade da autora em razão da inconstitucionalidade do art. 57, § 8º da Lei 8.2.13/91. O INSS recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal Federal (STF). 

O que é a declaração de inconstitucionalidade e o que diz o art. 57, § 8º da Lei nº. 8.213/91?

A Lei nº. 8.213/91 é a lei que trata dos benefícios previdenciários do INSS. Esta lei traz a necessidade de afastamento do trabalho na função especial para aqueles que se aposentam pela Aposentadoria Especial. Ou seja, um mecânico de manutenção de aeronave que se aposenta pela especial, em razão desta atividade, deverá se afastar da função de mecânico, ou se afastar dos riscos oriundos da função. Isto é o que está previsto no artigo 57, § 8º da referida lei.

A declaração de inconstitucionalidade é quando o juiz, o tribunal ou o ministro de Tribunal Superior declara que determinada lei ou artigo de lei é contrário à Constituição Federal de 1988 (CF/88), vindo então a ser declarada inconstitucional.

Este foi o entendimento do TRF4 quando interpretou o artigo 57, § 8 da Lei nº. 8.213/91. O TRF4 interpretou que não poderia a referida lei determinar o afastamento do trabalho quando a Constituição Federal assim não tivesse determinado.

Além do mais, entendeu o TRF4 que o art. 57, § 8º não visava a proteção à saúde, mas tão somente a proteção ao erário, pois não determinava que o trabalhador parasse de trabalhar quando atingisse os 25 anos, mas tão somente que ele não pudesse receber a sua aposentadoria.

Com este entendimento do TRF4, após recurso do INSS ao STF, foi recebido e criado o tema 709.

Qual foi a decisão tomada pelo STF no julgamento do TEMA 709?

O relator do processo no STF foi o Min. Dias Toffoli. O relator após análise do caso passou a discorrer a respeito do que é aposentadoria especial e qual o seu significado. Concluiu o relator que a aposentadoria especial tem caráter protetivo, de preservação da saúde, bem estar e integridade do trabalhador exposto a agentes nocivos a sua saúde. 

Afirmou que a aposentadoria especial protege a presunção absoluta de incapacidade decorrente do trabalho prestado, ou seja, presume-se que com a prestação do trabalho o trabalhador restará incapacitado no longo prazo, justificando o tempo reduzido para a aposentadoria.

Defendeu ainda o relator que possibilitar a continuidade no trabalho daquele aposentado especial com tempo muito inferior ao aposentado comum, seria desrespeitar o princípio da isonomia (igualdade), pois criaria odiosa forma de tratamento desigual entre os cidadãos, o que seria contrário aos espíritos da Constituição da República e da legislação previdenciária.

Afirmou ainda que é garantido ao beneficiário da aposentadoria especial que busque outras fontes de renda caso pretenda complementá-la, desde que busque ocupação que não danosa à sua saúde.

O relator trouxe outros argumentos para fundamentar sua decisão, no sentido de que é inviável o recebimento do benefício da aposentadoria especial de forma simultânea com o desempenho da própria atividade especial.

A tese fixada pelo relator Sr. Min. Dias Toffoli para o tema 709, seguida pela maioria do tribunal, dando parcial provimento ao recurso interposto pelo INSS, foi dividida em 02 enunciados:

1) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.

2) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.

Quem já tem processo na justiça, o que fazer?

Neste tópico irei tratar da situação daqueles Aeroviários que já ingressaram com o requerimento junto ao INSS e, com a negativa do órgão previdenciário, ingressaram na justiça, por meio de seus advogados, postulando o reconhecimento da Aposentadoria Especial, mesmo com a pendência da decisão do STF sobre o tema 709.

A situação é delicada para aqueles que não pretendiam parar de trabalhar, mas mesmo assim ingressaram com a ação na justiça. Era arriscado ingressar na justiça, visto que a decisão do STF poderia ser prejudicial, como de fato o foi.

Certamente há casos em diversos estágios na justiça. Iremos abordar aqueles principais de acordo com os subitens abaixo:

Para quem ainda não teve sentença.

Quem ainda não teve sentença, o juiz quando julgar irá levar em consideração o novo entendimento do STF no tocante ao art. 57, § 8º, em razão do julgamento pelo STF do tema 709. 

O juiz irá determinar o imediato afastamento do aeroviário para que receba o benefício.

Caberá ao aeroviário, por meio do seu advogado, recorrer da decisão, caso queira continuar trabalhando. Se não recorrer, provavelmente o INSS recorrerá. Ao final do processo, o aeroviário terá de escolher entre receber o benefício mensalmente e trabalhar. Não será possível acumular o benefício com o trabalho.

Caso opte em continuar trabalhando, importante esclarecer que poderá receber os atrasados (valores devidos desde o requerimento administrativo até a decisão final da justiça), sendo que o seu benefício será suspenso até o definitivo afastamento da atividade ou dos riscos da função, quando então o aeroviário poderá retornar ao INSS e solicitar a reativação do seu benefício, passando a receber normalmente a partir de então.

O tempo de duração do processo será o momento para o autor definir o que fará em relação ao seu emprego, se conseguirá uma adaptação em outra função (muito difícil no caso dos aeroviários), se pedirá as contas, se fará um acordo com a empresa, se será demitido, ou ainda, em alguns casos, se abrirá mão da aposentadoria para continuar trabalhando.

Para quem aguarda decisão do Tribunal Regional Federal.

Nestes casos, muito parecido com a situação acima, o Tribunal Regional Federal já irá se adequar ao que foi decidido pelo STF no tema 709, ou seja, o Tribunal deverá determinar o imediato afastamento do autor com a implantação do benefício.

Caberá ao aeroviário, por meio do seu advogado, recorrer da decisão, caso queira continuar o processo e continuar trabalhando. Se não recorrer, o processo poderá encerrar. Ao final do processo, o aeroviário terá de escolher entre receber o benefício mensalmente e trabalhar. Não será possível acumular o benefício com o trabalho.

Caso opte em continuar trabalhando, importante esclarecer que poderá receber os atrasados (valores devidos desde o requerimento administrativo até a decisão final da justiça), sendo que o seu benefício será suspenso até o definitivo afastamento da atividade ou dos riscos da função, quando então o aeroviário poderá retornar ao INSS e solicitar a reativação do seu benefício, passando a receber normalmente a partir de então.

O tempo de duração do processo será o momento para o autor definir o que fará em relação ao seu emprego, se conseguirá uma adaptação em outra função (muito difícil no caso dos aeroviários), se pedirá as contas, se fará um acordo com a empresa, se será demitido, ou ainda, em alguns casos, se abrirá mão da aposentadoria para continuar trabalhando.

Para quem estava aguardando manifestação do STF sobre o tema 709.

No dia 23/02/2021 foram julgados os Embargos de Declaração no tema 709 pelo STF.

Basicamente 4 questões importantes foram definidas:

1) Ficou decidido que aqueles que estavam recebendo o benefício por força de antecipação de tutela (liminar) não terão a necessidade de devolver nenhum valor recebido. Pelo menos até a data do julgamento (23/02/2021). O texto do julgamento ficou um pouco confuso, pois dá a entender que os valores recebidos após 23/02/2021 teriam de ser devolvidos. Mas a nossa interpretação não é esta. Conforme o próprio teor do julgamento os valores recebidos por meio de tutela antecipada (liminar), não precisarão ser devolvidos, pois a tutela antecipada somente poderá (e deverá) ser derrubada por meio de ordem judicial.

2) Ficou decidido que aquele que continuar a trabalhar terá o seu benefício suspenso e não cassado (cancelado). Portanto, apenas será cessado o PAGAMENTO do benefício, podendo ser reativado tão logo o trabalhador se afaste do risco.

3) Apesar de não ter sido tratado nos embargos de declaração a respeito de quem decidirá no caso do trabalhador se afastar do risco e continuar no emprego, interpretamos tal questão da seguinte forma, dividindo em duas situações:

  • Para quem recebe tutela: o próprio juiz do processo, tão logo seja solicitado a derrubada da tutela, para que ele possa  justificar a manutenção da antecipação de tutela. O aeroviário deverá juntar provas de que se afastou dos riscos da atividade.
  • Para quem ainda não recebe tutela: o próprio juiz do processo, porém ao final do processo, ou seja, após o trânsito em julgado da ação, no cumprimento de sentença, também chamada de fase de cálculos do processo.

4) Foi reforçado que serão garantidos o pagamento dos atrasados, desde o início do pedido feito no INSS até o trânsito em julgado da ação (quando não cabem mais recursos). 

Já teve decisão final e o INSS não recorreu.

Para quem já teve decisão final em seu processo sendo que o INSS não recorreu, aceitando a manutenção do emprego, ou, por exemplo, o autor optou por se afastar do trabalho ou mudar de função, nestes casos, não haverá qualquer reflexo para tais situações, uma vez que o processo já se encerrou. Não precisará devolver qualquer valor e poderá continuar trabalhando e recebendo o benefício.

Quem tiver que sair do emprego, deverá pedir demissão ou será demitido?

Esta questão não é de competência do direito previdenciário, mas exclusiva do direito trabalhista. Portanto, tal questão deverá ser discutida em sede da Justiça do Trabalho.

Entretanto, tal questão já foi enfrentada pela Justiça do Trabalho diversas vezes, sendo que recentemente o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que a Aposentadoria Especial sendo requerida por iniciativa do trabalhador o empregador não precisará pagar a multa de 40% sobre os depósitos de FGTS.

O fundamento da decisão foi o fato de que o contrato de trabalho não foi extinto por iniciativa da empresa, mas sim do empregado, que optou pela aposentadoria em decorrência da especialidade.

Deste modo, apesar de ter Orientação Jurisprudencial (OJ) nº. 361 da SBDI-1 do TST que afirma que a aposentadoria não é motivo de extinção do contrato de trabalho, afirmou o próprio TST que no caso da Aposentadoria Especial, por ser benefício sui generis que, inclusive, tem previsão de afastamento das atividades após aposentadoria especial, conforme art. 57, § 8 da Lei 8.213/91, se distingue dos demais benefícios de aposentadoria e, desta forma, não tem aplicação da OJ nº. 361, estabelecendo, por fim, que a Aposentadoria Especial extingue o contrato de trabalho a pedido do empregado.

Entretanto, decisões de juízes do trabalho e tribunais do trabalho ainda contrariam este entendimento, no sentido de que deve o empregador recolocar o empregado em alguma atividade que não o exponha aos riscos, não podendo simplesmente demití-lo. 

Deste modo, orientamos aqueles que se encontram nesta situação sempre procurar um advogado especialista em direito do trabalho antes de pedir demissão.

Quem ainda não fez o pedido no INSS por receio de ter que parar de trabalhar, o que fazer?

Este é o ponto mais importante, pois muitos clientes que mantenho contato ainda tem receio de fazer o requerimento administrativo em razão do risco de ter que se afastar do emprego.

Contudo, a verdade deve ser dita e compreendida:

NÃO HÁ QUALQUER PREJUÍZO EM FAZER O REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PERANTE O INSS. 

O requerimento realizado perante o INSS, ao contrário, é a estratégia correta e ideal a ser tomada.

Explico. 

Com o requerimento administrativo será definido o ponto inicial dos recebimentos dos valores no futuro, quando de fato o autor decidir ingressar na justiça para receber o benefício.

Conforme o próprio STF decidiu no item 2 da tese vencedora do tema 709 que: 

“a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros.”

Desta forma, denota-se que a estratégia mais acertada, para aquele que já atingiu os 25 anos, mas ainda não deu entrada no requerimento por receio de se afastar da função, é fazer o requerimento o quanto antes e discutir administrativamente o pedido até o máximo de tempo possível (2, 3, 5 ou até 10 anos se necessário, será possível discutir administrativamente o direito), para somente após, quando efetivamente estiver preparado para parar de trabalhar, ingressar com o pedido na justiça para postular não só o benefício da Aposentadoria Especial, mas sim todos os valores retroativos e acumulados (dos 2, 3, 5 ou até 10 anos do processo administrativo).

Este anos serão o tempo que o aeroviário terá para se preparar para de fato parar de trabalhar na pista.

Lembrando que ainda terá o tempo do próprio processo judicial, que via de regra leva alguns anos (em média pelo menos de 2 a 3 anos).

O tempo que necessitará para se planejar e parar de trabalhar na função deverá ser avaliado em conjunto com o seu advogado, para que definam qual a estratégia deverão seguir no processo, para que as coisas andem mais rápido ou mais devagar.

Lembrando que aqui não se busca faltar com a moralidade e ética tão esperada do advogado, mas somente visa a garantir o melhor direito ao cliente, dentro da situação individual e peculiar de cada cliente, sem ferir qualquer direito estabelecido em lei.

Bruno Mesko Dias,
OAB/RS 72.493 e OAB/SP 447.904
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Advogado especialista em direito previdenciário e trabalhista dos aeronautas e aeroviários.

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